Outro rabequeiro encontrado e registrado pelo musicólogo carioca Luiz Heitor Corrêa de Azevedo, em Fortaleza, foi o Cego Ferreirinha. De acordo com esse pesquisador,o cantador, natural do Crato, tinha 34 anos em 1943 e aprendera a tocar o violino (rabeca) quando era menino (Azevedo, 1953, p. 27). Ferreirinha era acompanhado dos violeiros cearenses Manuel Pereira, nascido em Quixadá, e Vicente Feitosa, procedente de Lavras de Mangabeira, que tinham vinte e trinta anos, respectivamente, na época (Azevedo, 1953, p. 29-31).

Os registros obtidos pelo musicólogo carioca demonstram que Ferreirinha era um músico que se expressava por meio do repertório clássico dos cantadores, mas também através de gêneros populares urbanos, particularmente, modinhas. Como exemplos do primeiro caso, o pesquisador registrou versos de dez pés: "As florestas do sertão" (58)*, um "Galope à beira mar" (59) e uma "Parcela em desafio" (62); além de um "A B C" (60/62) (Azevedo, 1953, p. 10-27).

Dentro do repertório de música popular urbana, Ferreirinha e seu grupo forneceram seis exemplos de modinhas a Luiz Heitor: "Como criança" (48 B), "Cai a noite, serena
a madrugada" (49 A), "Adeus, Maria!" (49 B), "Por ti abandonei" (50 B, b/51 A, a), "Andorinha" (51 A, b) e "Vou embora pelo mundo, ó mulher!" (51 B). Além delas, o musicólogo registrou algumas peças instrumentais: um schottisch ("Chicute da Jurema", 48 A, a), uma mazurca ("Raposa magra", 48 A, b), um samba ("Samba da saudade", 48, c) e uma valsa ("Valsa do sertão", 48 A, d).

Luiz Heitor apresenta transcrições da melodia principal de três das peças instrumentais interpretadas por Ferreirinha e seu grupo. O schottisch "Chicute da Jurema", diferente daquele tocado por Sinfrônio, é modal e está em sol mixolídio, enquanto que a mazurka "Raposa magra" e o "Samba da Saudade" são tonais, em Ré maior (Azevedo, 1953, p. 59; 60; 63). Também diferente de Sinfrônio, mas em acordo o estilo da maioria dos cantadores, Ferreirinha não costuma se acompanhar enquanto canta, com essa função sendo realizada pelos violeiros do grupo. Nas peças de cantoria, ele realiza interlúdios instrumentais entre os versos.

A rabeca de Ferreirinha era afinada
em 5as, mas as alturas eram ajustadas pelo rabequeiro de acordo com a peça que iria cantar, subindo ou descendo todas as cordas (Azevedo, 1953, p. 55). Uma imagem de Ferreirinha, tendo os companheiros violeiros, um de cada lado, está publicada em Azevedo (1953, entre as páginas 8 e 9). Outra, que foi tomada durante os trabalhos de gravação realizados por Luíz Heitor, em 1943, pode ser vista também na tese de Henrique Drach (2011, p. 250), acessível em http://www.historia.uff.br/stricto/teses/Tese-2011_Henrique_Drach.pdf.

*Essa codificação corresponde ao disco (Número), lado (A ou B) e faixa (a, b, c, d) em que se encontra o registro no Laboratório de Etnomusicologia da UFRJ.