A maior parte das informações biográficas e a respeito da poesia de Sinfrônio Pedro Martins (grafado Symphronio na primeira edição de "Cantadores"), o Cego Sinfrônio, pode ser encontrada em "Cantadores" (Mota, 2002, p. 9-26); em relação às características de sua performance poético-musical, nos registros de áudio realizados por Luiz Heitor Corrêa de Azevedo, em 1943, no trabalho escrito por esse autor a respeito desse mesmo material (Azevedo, 1953), assim como no de Dulce Lamas (1973) sobre a música dos cantadores.

De acordo com Leonardo Mota, Sinfrônio nasceu no Jabuti, localidade do município de Itaitinga, Região Metropolitana de Fortaleza, tendo cegado com apenas um ano de idade. Em Cascudo (2009, p. 351), encontra-se a informação de que ele teria, em 1937, aproximadamente 56 ou 57 anos, o que permite inferir que seu nascimento se deu por volta de 1880. Ele faleceu no ano de 1943, na cidade Fortaleza, com cerca de 63 anos de idade (Mota, 1961, p. 250).

Cantador de profissão, Sinfrônio viajou bastante pelo Sertão Nordestino e possuía memória privilegiada e enorme repertório,
que incluía romances, cantigas e desafios (Mota, 2002, p. 9). Através dos registros de Azevedo, percebe-se que o cantador também era exímio instrumentista, como atestam as gravações de quatro peças instrumentais.

Sinfrônio foi casado e sua mulher era quem lhe lia as peças impressas, até que as decorasse. Em suas viagens, Sinfrônio travou desafios com diversos cantadores, entre os quais, Leonardo Mota cita o pernambucano, Elias Ferreira, também cego, e, na cidade de Sobral, Ceará, com Manuel Passarinho (Mota, 2002, p. 9-13).

Dos exemplos encontrados para nossa pesquisa, constata-se que Sinfrônio empregava a sextilha na maior parte dos casos: estrofes cantadas quando visitou a casa de Leonardo Mota pela primeira vez, os referidos encontros com cantadores em Pernambuco e Sobral e a "Cantiga do Vilela". Entretanto, Leonardo Mota registra duas estrofes em quadras de seu desafio com Jacó Passarinho. Chama atenção o desafio de Jerônimo do Junqueiro com Zefinha do Cabochão, que o autor de "Cantadores" denomina “cantiga”. Nesse exemplo,
Sinfrônio utiliza versos dispostos numa grande variedade de pés. Estão presentes as sextilhas e quadras tradicionais. Porém, o cego cantador recita estrofes com oito, dez, doze e quatorze linhas, com as rimas nos versos pares, do começo ao fim dessas estrofes, enquanto que os ímpares são livres (Mota, 2002, p. 9-26).

Luiz Heitor registrou, além das peças instrumentais já citadas, duas “cantorias” (versos improvisados) e a "Cantiga do Vilela". Entre as primeiras, um "Schottisch" (64 A, a)*, a "Toada do Beira d’Água" (64 A, b), um "Cherem" (64 A, c) e um "Baião" (64 A, d). O autor publicou transcrições do schottisch e do baião (Azevedo, 1953, p. 60; 62) e Dulce Lamas (1973, p. 244), da toada. Infere-se, a partir desses documentos e dos arquivos de áudio, que essas peças podem ser mais apropriadamente representadas em partitura, com ritmo bastante marcado e preciso, e que são tonais.

Diferentemente, a "Cantiga do Vilela", modal (em mixolídio), tem caráter recitativo, com ritmo mais livre,
dificultando sua escrita na partitura, como reconhece esta autora, que propõe, apesar disso, uma versão (Lamas, 1973, p. 242).

A rabeca de Sinfrônio era afinada em quintas, como os violinos, com exceção da quarta corda, um tom acima, formando um intervalo de 4ªj com a terceira (La2 – Ré3 – Lá3 – Mi4). De acordo com Luiz Heitor, as notas eram “bemolizadas” (Azevedo, 1953, p. 55). Tanto nas duas “cantorias” (64 B e 68) como na "Cantiga do Vilela" (65-67), Sinfrônio emprega o instrumento em uníssono com os versos, realizando os interlúdios instrumentais em ritmo mais marcado.

A seguir, uma das sextilhas mais famosas do cantador rabequeiro, que tem versões diferentes interpretadas por Cego Oliveira e Zé Oliveira.

Esta minha rabequinha
É meus pés e minhas mão,
Minha foice e meu machado,
É meu mio e meu feijão,
É minha planta de fumo,
Minha safra de algodão
Conhecemos duas imagens de Sinfrônio, uma publicada na primeira edição de "Cantadores" (Mota, 1921, entre as páginas 32 e 33) e outra registrada por Luiz Heitor, em 1943, publicada na tese de doutorado de Henrique Drach (2011, p. 253), que pode ser acessada em http://www.historia.uff.br/stricto/teses/Tese-2011_Henrique_Drach.pdf.

*Essa codificação corresponde ao disco (Número), lado (A ou B) e faixa (a, b, c, d) em que se encontra o registro no Laboratório de Etnomusicologia da UFRJ.